quinta-feira, 13 de maio de 2010

CAPÍTULO 06 - NOVELA O QUINZE

CAPÍTULO 06

Afinal ali estavam. Foi realmente com dificuldades que os identificou e marchou para eles, com o coração estalando de pena lembrando da última vez que os vira num passeio às Aroeiras feito em companhia de Dona Idalina. Chico bento chegando do campo todo encourado e Cordulina muito gorda, servindo café às visitas.
Nesse dia, Cordulina pedira a Conceição e a Vicente que aceitassem ser padrinho da criança que estava por nascer. Conceição nunca vira o afilhado. Já estava na cidade, ao tempo do batizado. E lembrava-se da procuração que enviara, o seu nome junto ao de Vicente.
Enfim, ali estavam. E a criança, era decerto aquela tão magra que nem uma visagem, que nem morte, só o esqueleto de tão magra...
_Por aqui, compadre? Quando chegou?
Chico Bento ouviu a fala e ergueu os olhos, numa surpresa:
_Ah! Comadre Conceição! A senhora por aqui? Cheguei ontem.
A moça se dirigia a Cordulina:
_E você, comadre, como vai? Tão fraquinha hein?
A mulher respondeu tristemente:
_Ai, minha comadre, eu sei lá como vou!... Parece que ainda estou viva...
_É este o meu afilhado?
_Cadê a bênção da madrinha, Manuel? Não é Manuel o nome dele?
_É inhora sim; mas os meninos chamam ele de Duca...
_Vocês vieram de trem, compadre?
_Só de Acarape pra cá. Das Aroeiras até lá tinha-se vindo por terra...
_Virgem Maria! Como foi que um bichinho destes agüentou! Só milagre!
_Só Deus Nosso Senhor sabe...
Conceição arranjou um ranchinho melhor para eles. E saiu puxando o grupo:
_Venham! Comadre pegue suas trouxas; tragam os meninos. Antes que cheguem outros e tomem... Lá era melhor. O chão era limpo e duro, havia um lugarzinho protegido para acender o fogo.
_Se acomodem aqui, que é melhor. Agora venha comigo, compadre, receber a ração de comida que está na hora. Não tem uma vasilha?
E saiu depressa, segurando as pregas da saia de lã azul, em direção ao local da distribuição; atrás dela Chico Bento arrastava os pés, curvado, trêmulo com a lata na mão estendida, esperando a esmola.
Sentado na salinha da Rua São Bernardo, o velho chapéu entre as pernas, Chico Bento conversava com Conceição e a avó sobre o futuro. Tristemente contou toda a fome sofrida e as conseqüentes misérias. A morte de Josias, naquela velha casa de farinha, o caso da cabra e a fuga de Pedro.
Os olhos da moça e de Dona Inácia se enchiam de lágrimas.
Agora, felizmente, estavam menos mal. O que precisava era arranjar trabalho, porque o que davam no Campo mal chagava para os meninos.
Conceição concordou:
_Eu sei, é uma miséria! Mas você assim, tão fraco, lá agüenta um serviço bruto, pesado que é só o que há para retirante!
_A natureza da gente é que nem borracha... Havendo precisão, que jeito? Dá pra tudo...
_Olhe, todo dia, você ou a comadre apareçam por aqui e o que nós juntarmos, em vez de se dar aos outros, guarda-se só pra vocês. Eu vou ver se arranjo alguma coisa que lhe sirva... Assim uma vendinha de água, hein, mãe Nácia?
_Sim, uma venda de água... A questão é o animal...
_E o Tauape comadre?
Conceição acolheu com calor aquela lembrança oportuna:
_Ah! O Tauape! Lá naturalmente é fácil de se arranjar!
Chico bento retificou:
_Fácil não era não... Que ele tinha visto muitos, bem recomendados, voltando porque não tinha mais ferramenta.
_Só se a comadre arranjasse um cartãozinho do bispo...
_Pois eu vou ao palácio do bispo! Fique certo. Vou e arranjo. Mais um ou dois dias, e você está no Tauape.
O vaqueiro levantou-se para ir embora. Conceição cochichou com a avó, e entrou pelo corredor, gritando:
_Espere aí, compadre! Tenho uma encomendazinha para você levar pros seus meninos...
Armado com um cartãozinho do bispo e um bilhete particular de Conceição à senhora que administrava o serviço, Chico Bento conseguiu o ambicionado lugar no açude do Tauape.
Duramente Chico Bento trabalhou todo o dia no serviço da barragem. Só de longe em longe parava para tomar fôlego, sentindo o peito cansado e os músculos vadios. E o almoço, ao meio dia, onde, junto ao pirão, um naco de carne cheiroso emergia, mal o animou, pois lembrava de Cordulina e os meninos engolindo um triste resto de farinha.
Mas à tarde, quando sentiu tinir no bolso o dinheiro ganho com seu esforço, ficou animado porque iria alimentar a filharada esfomeada...
Cordulina já o esperava inquieta. Desde que Josias morrera e Pedro fugira vivia cheia desses terrores de morte e abandono.
Chico Bento chega trazendo um pão, rapadura e um pouco de café. E o alvoroço da meninada que o acolheu e lhe arrebatou as compras, bem lhe pagou as tristes horas do dia, curvado sobre a pá, em tempo de morrer de calor e cansaço...
Mais tarde, já deitados, Cordulina lhe falou, meio hesitante:
_Chico, a comadre Conceição, hoje, cansou de me pedir o Duquinha. Anda com um destino de criar uma criança. E se é de ficar com qualquer um, mais vale ficar com este, que é afilhado...
_E o que você disse?
_Que por mim não tinha dúvida. Dependia do pai...
¬ _ Tu não tem pena de dar teus filhos, que nem gato ou cachorro?
_Que é que se é de fazer? O menino cada dia é mais doente... A madrinha quer carregar pra tratar, botar ele bem, fazer dele gente... Se nós pegamos nesta besteira de não dar o mais que se arranja é ver morrer como o outro...
Chico Bento calou-se e ficou olhando a luz vermelha, enorme e lustrosa que ia se levantando devagar. Mas detrás dele a mulher insistiu:
_Que foi que você resolveu Chico?




NÃO PERCA O PRÓXIMO CAPÍTULO PARA SABER SE CHICO BENTO ENTREGA OU NÃO O DUQUINHA PARA CONCEIÇÃO!

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